O clima da noite estava ótimo, apesar da chuva que hora vinha e ia. Para nos proteger das águas de São Pedro, nos abrigamos na frente de um fiteiro, bem ao lado do estacionamento de motos. Uma mulher se aproximava no momento que eu estava colocando os assuntos em dia com uma pessoa especial que eu não via há muito tempo. Elionay.
Dona Eliane é uma guerreira. É o retrato desse nosso Brasil desfocadíssimo e de carne e osso. |
E lá vinha a criatura. Um mulher se aproximando com as mãos sujas, roupas rasgadas, toda despenteada. Ela vestia uma camiseta regata (não sei definir ao certo, pois não entendo muito de roupa de mulher), e também usava uma bermuda bem folgada, que hora ou outra levantava de maneira engraçada. Carregava uma garrafa de alegria debaixo do braço. Era um litro já no fim de um carreteiro. Numa mão, carregava consigo uma sacola de moedas. Na outra, carregava um material, que provavelmente ela deve ter encontrado nas proximidades. Era uma sacola com um shampoo e condicionador. Antes de fazer o seu pedido para acrescentar em uma de suas sacolas mais uma moeda de cinquenta centavos, reclamou de uma mulher que estava brigando com seu namorado ali próximo. Apontando pro nada, reclamou: "Aquela cigana que ta ali estava brigando com o marido dela. Ela não devia fazer isso. eu fui pedir cinquenta centavos a ela, mai ela me expulsou de lá", disse Eliane, se movimentando cheias de gestos. Tentando parecer revoltada. o que realmente aconteceu, foi que Eliane parecia ter gostado do sujeito que estava com a mulher da qual ela reclamava. Provavelmente ela deve ter se apaixonado-repentinamente pelo rapaz. Um surto de amor que acabou minutos depois.
Eliane carregava um triste semblante no olhar. por outro lado, sua loucura aparentava deixar o peso da sua vida mais leve. Reclamou do filho obeso. Falou de sua casa na Torre de Babel (Valentina), e disse que quando cansa de lá, corre para pedir nas areias brancas das praias de Cabo Branco e Tambaú. Eline, que antes de dar um pouco de atenção para ela, achei que era uma moradora de rua, ainda falou que conseguiu uma aposentadoria plena, devido à seu problema psíquico. "Mês que vem não vou pedir mais, sabe? Vou me aposentar. Pode me chamar de 'diazepam'. Eu sou doida (sorriu). Consegui por causa disso mesmo.", disse a mulher. Perguntei a Eliane se ela ia parar mesmo de pedir após sair a aposentadoria e ela disse baixinho, bem educada, apesar dos gestos e da maneira rápida de se movimentar: "Sim", respondeu Eline continuando: é muito ruim pedir nas rua. Ver aqui mesmo. Esse povo todinho (disse apontando para a frente do Bar lotado) olha o tanto de moedinha". Na sacola havia pouco mais de 20 moedas.
A minha impressão era que Eliane se sentiu à vontade conosco. Eramos os únicos que não estávamos juntos do pessoal que se concentravam no bar e na frente dele, que ela criticava, da sua maneira, mas criticava. Não demorou muito e ela silenciou, e passou a observar. Elogiou os cabelos cacheados de Nay, mostrando seu conhecimento tecnico-feminino-nos-cabelos, quando usou o termo "babyliss", termo que aprendi o sinônimo hoje no google. Eliane mudou o olhar. Olhava minhas vestes como se não tivesse me visto antes. Observou meu tênis, minhas calças, passou a mão na minha camisa "engomada", como ela mesmo disse. Obvervou Nay da mesma forma, e disse: "Vocês são lindos".
Eu e meu dom de estar em dois lugares ao mesmo tempo, cheguei a conclusão que a ficha da Eliane caiu naquele momento. Éramos aquelas mesma pessoas que estavam por ali, só que diferente das outras, sorrimos e demos atenção à uma senhora que estava fazendo 45 anos naquele dia. Demos os parabéns, e percebemos que era a hora de deixar a mulher segui seu caminho. Inventamos uma desculpa de banheiro, e ela seguiu sua estrada. Happy birthday to Eliane.
[E olhe que esqueci metade do ocorrido. Eu estava bêbado]
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